5 anos de meditação


Nós temos muito poder. O que falta às vezes é conhecimento desse poder e treino para colocá-lo em prática.

Eu sei que não sou a única, ruminando pensamentos de conversas passadas; coisas que eu deveria ter dito, mas não tive coragem de comunicar; situações que me deixam com raiva; uma autocrítica exarcebada que somente foca no que fiz errado, e naquele comentário estranho que fiz no happy hour que deixou todo mundo desconfortável. Ai, que vergonha... O que eles vão pensar de mim?

Esses pensamentos carregam sentimentos que refletem no corpo físico. A ansiedade é palpável, pesando no peito e dificultando a respiração. Eu passei anos reproduzindo esse padrão, desde a adolescência, e eu não estava ciente de que esse comportamento fazia parte dos meus dias. Era cotidiano me perder nessa ruminação destrutiva. Tão cotidiano quanto escovar os dentes.

2019 foi o ano que eu comecei a sentir e observar meu corpo e mente. Foi também o ano que eu me mudei para a França. Sinceramente? Eu acredito que minha mudança para a França, longe de tudo o que eu conhecia, foi essencial para esse retorno para mim mesma. Eu tive espaço para recomeçar e explorar partes de mim que eram, então, desconhecidas.

Eis que a meditação entra em cena.

Eu passava muito tempo sozinha. Li muitos livros e blogs e me joguei com tudo na piscina da espiritualidade. Na verdade... não é uma piscina, pois essas águas parecem não ter um limite. Eu li uma série de livros espirituais em francês: registros akashicos, chakras, meditação. E eu coloquei tudo em prática.

Como esperado, o início da minha jornada na meditação foi muito difícil - em todos os sentidos! Inquietação, memórias, ruminações, cenários catastróficos que pop! pipocavam inesperadamente no espaço mental. Eu também sentia um medo ridículo de sentar de olhos fechados, sozinha no meu apartamento. O que eu encontraria caso eu abrisse os olhos? E a autocrítica por esse medo ridículo? Eu abria os olhos para me certificar de que não haveria ameaças a minha frente. All clear. Copy that. E fechava os olhos novamente. E a dor nas costas - de ficar imóvel de pernas cruzadas?

Dias de batalha, dias de vitória.

Dias que eu desistia depois de 5min. Dias que eu alcançava 20min e não ousava sair daquela posição, pois meu corpo se sentia aconchegado, e minha mente, serena. E nunca foi uma constante. E ainda não é. Contudo, mês após mês, localizar e entender a dor do meu corpo foi ficando cada vez mais fácil; localizar e entender a fonte dos meus pensamentos, também.

Acho que foi em um dos vídeos da Monja Coen que entendi a prática da meditação em poucas palavras: meditação é a prática mais simples e mais difícil ao mesmo tempo. Simples, pois basta sentar e observar seus pensamentos; difícil, pois temos que sentar e observar nossos pensamentos.

Se você conhece a teoria da meditação, já sabe que é só sentar, sentir o corpo, focar na respiração, observar os pensamentos vindo como uma onda à beira-mar, e então deixá-la voltar para o local de onde veio. Nós temos tanto poder. Você pode ainda não ter acessado esse poder, mas você tem, sim, o poder de ver esses pensamentos se aproximando, e permitir que eles retornem com amor.

E esse é o processo da meditação. Não é um ponto de chegada, mas um processo contínuo. Vendo uma pessoa meditando, a face serena, os braços repousando sobre as pernas, você pode até pensar que não há nada se passando na cabeça daquela pessoa. Entretanto, ela está constantemente observando a onda vindo, molhando os pés, e permitindo que ela volte para seu local de origem. O tempo todo. Entre uma onda e outra, há um espaço de tranquilidade, um espaço em branco, mas a onda sempre retorna à beira. E quanto mais você medita, mais duradouro é esse espaço.

Eu achava que esse movimento da onda se aplicasse apenas aos poucos minutos em que eu estivesse sentada de perninhas cruzadas, e assim pensei durante os primeiros 4 anos de meditação. Foi só recentemente - em uma de minhas ruminações cotidianas - que me dei conta do poder de deixar a onda voltar sem julgamento. Eu passei anos fazendo isso de pernas cruzadas. Por que eu não poderia fazer o mesmo ao longo do dia? Enquanto escovo os dentes. Enquanto tomo banho. Enquanto lavo a louça. Enquanto trabalho. Então decidi praticar isso ao longo dos vários momentos que constituem o meu dia.

É claro que, para tanto, precisamos estar conscientes do movimento que a onda faz. E eu ainda estou aprendendo a ouvir a onda se aproximando. Tem dias que a ruminação começa, e eu me dou conta que estou levando caldo após caldo, quase me afogando. Tá acontecendo de novo, eu penso. Então respiro e permito que a onda volte para junto das águas. Mas a onda retorna e molha meus pés. E permito que ela regresse mais uma vez. E aquela conversa que não falei o que deveria ter fal— deixo a onda voltar. E o arrependimento de não ter— deixo a onda voltar. O número de vezes que for preciso.

Tem dias que não estou consciente do movimento da onda, mas estou treinando minha observação. E é isso o que aprendi com 5 anos de meditação. Ela se estende para o resto do dia.

Comentários

  1. Que relato gostoso de ler. Realmente meditação é uma prática simples porém difícil. Sua história de persistência é inspiradora, e realmente há frutos nisso.

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  2. no último livro de ACOTAR eles abordam a meditação (me dei conta disso agora lendo teu texto) quando estão trabalhando as técnicas das valquírias, se não me engano. achei sensacional ler isso e fazer a ligação com parte do livro. falam inclusive dessa coisa das ondas se arrebentarem na parede mental. DEMAIS! deu até vontade de reler :)

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    1. Então!!!!! Eu comecei a ler ACOTAR (3 dias atrás) por tua causa Ba!!!! Tô no 7° capítulo. Nada de meditação ainda, mas fiquei curiosa agora! by the way, tô amando o livro!

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  3. Adorei o que você pontuou. De fato, a meditação se estende para o resto do dia, porém precisamos estar muuuito atentos para perceber isso, não é?
    Eu costumava meditar todos os dias, mas confesso que perdi o hábito de uns meses pra cá. Vou tentar voltar à pratica aos poucos. :)

    Estante da Pipoca

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    1. oie! mas eu não medito todos os dias. eu também tenho fases. claro que é bom meditar regularmente, mas mais importante do que isso é saber identificar aqueles dias que a gente mais precisa, sabe?

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  4. O mais próximo que já cheguei de meditação foi nas aulas de yoga e na época que eu praticava Budismo Nitiren. É muito gostoso acessar esses outros estados da nossa mente. São como ondas mesmo que você vai sintonizando, como as ondas do rádio. Espero que você consiga manter essa prática.

    www.umnovodestino.com.br

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    1. sim, é muito bom chegar nesse estado <3 mas não é sempre que eu consigo heheheh

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