interrompendo a fala do outro para falar de si mesmo?


Eu estou sempre analisando comportamentos a minha volta. O conteúdo do que a pessoa está falando. A forma como ela expressa suas ideias. Os desenhos que suas mãos traçam no ar. O volume da voz. E enquanto essa pessoa fala, aproveito para dar uma olhadinha nas pessoas a seu redor. Eu gosto de ver quem está escutando - realmente escutando.

Você descreveu tudo o que aconteceu nos mínimos detalhes - tia Udila se referia a um post do meu blog - Eu não teria me lembrado de metade do que aconteceu naquele almoço. Minha tia acha que eu levo jeito com as palavras como se essa competência fosse uma espécie de dom divino, mas o que dá cor, aroma e sentimento aos meus relatos é a arte de escutar.

Eu nem sempre fui uma boa ouvinte, e me lembro muito bem do desejo incontrolável de falar que tomava conta do meu corpo até pouco tempo atrás. Era uma obsessão. Eu tinha que falar sobre mim, e sobre como as coisas também aconteciam comigo, sobre como minha vida também era excitante, sobre como eu também já tinha viajado para tal cidade, sobre como eu também já tinha passado por tal situação.

Até que um dia eu me dei conta dessa mania.

E do quão desagradável essa mania era.

Não foi fácil corrigi-la. Foi uma disputa acirrada entre id (desejo) e superego (julgamento). Comecei a criar consciência dos reais motivos por trás daquele desejo de fala. Desejo e necessidade são coisas diferentes. Acredite quando eu digo que você não precisa fazer "só um comentário", "só um parêntese". Você não precisa interromper a fala do outro para, finalmente, vomitar um pouco de informação sobre você mesmo.

Na verdade, você pode, sim, escutar uma conversa do início ao fim sem fazer comentário algum.

Minha amiga Carol constantemente passa por esse processo de autoanálise, aliás, nossa amizade floresceu questionando o comportamento humano e, consequentemente, o nosso próprio comportamento. Logo no início da nossa amizade, nós discutíamos formas de evitar ser o tipo de pessoa que só fala sobre si, então desenvolvemos juntas a técnica das 02 perguntas.

Essa técnica consiste em escutar ativamente o que o outro está falando e responder com duas perguntas. Pode parecer um pouco forçado no início, mas depois se torna um hábito - como tudo na vida.

Como você se sente quando alguém te interrompe? Eu acredito que quando interrompemos a fala de alguém, não estamos dando o devido valor àquela pessoa e ao que ela tem a dizer. Relatos pessoais são preciosos. Então, olhe nos olhos daquela pessoa que também está te concedendo seu tempo. Esteja presente. Escute. Escute ativamente.

Comentários

  1. Esse post é muito interessante... lendo esse post comecei a pensar nas minhas atitudes... tento ao máximo ser uma boa ouvinte mas tb sinto um desejo enorme de falar sobre mim...
    vou fazer uma reflexão mais a fundo sobre isso

    beijos
    Carol Justo | Justo Eu?!

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    1. Oii, Carol! Eu acho essa autoanálise fundamental! E quando começamos a analisar nosso desejo de fala, damos espaço para outros tipos de análises comportamentais! Aproveite esse momento! Um beijo!

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  2. Isso é sabedoria! Não é fácil mas a gente vai aprendendo. Acho que comecei a ouvir mais, olhar nos olhos pós faculdade. É um ambiente onde todos querem opinar, mostrar "serviço", não julgo porque tbm faço o mesmo. Mas no processo a gente aprende que às vezes, só ouvir é necessário.

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    1. E mesmo quando a gente já está nessa caminhada há um tempo, a gente ainda se esquece desse costume de vez em quando haha

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  3. Lá vou eu fazer exatamente o que o post fala e falar de mim, risos. Confesso que eu sou bastante assim, e não gosto muito de pessoas que são assim. Mas é que é uma questão bem complicada mesmo. A verdade é que o problema não é falar de nós mesmos ou das nossas experiências, comentar sobre nossa perspectiva. A questão não é essa. A questão é que tem momento de acolher e tem momento de expressar, e às vezes a gente não consegue enxergar muito bem qual é qual. Como quase psicóloga, é uma habilidade que tive que desenvolver ao longo do curso e que agora estou bem melhor, mas que não foi fácil. Também aprendi a ser mais tolerante com pessoas que fazem isso, porque muitas vezes elas também não têm essa noção de quando é o momento de acolher e quando é o momento de falar. No fim das contas, é um equilíbrio que a gente tem que buscar, né?

    Beijinhos!
    https://mashalkhim.com/

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    1. Exato! Um equilíbro! Eu não sabia que tu estudava Psicologia - que lindo! Isso deve te trazer muito insight para vida! Pois é, eu tento não julgar quem ainda não consegue fazer isso, ou quem ainda não se deu conta, porque... é bem essa questão... é o SE DAR CONTA! haha

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  4. Identifiquei totalmente o que você apontou nesse post, inclusive identifiquei pessoas que já observei vivendo uma realidade ainda mais problemática: não trazem o assunto alheio para si, simplesmente ignoram o assunto do outro e atropelam os demais com OUTRO assunto aleatório, que diz mais a respeito deles no momento. Eu tenho percebido que estou deixando de falar sobre as minhas questões com MUITA gente, já que elas não serão efetivamente ouvidas/consideradas. Tenho um genuíno interesse no outro, mas acho que essa é uma arte em extinção.

    Não Me Mande Flores

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    1. Simmm! E como é interessante quando nós mesmas conseguimos fazer esse trabalho de análise e autoanálise, né? Uma vez que tu entende esse comportamento, tu não consegue mais ficar braba com o outro que não escuta... tu apenas vê um fato na tua frente: essa pessoa ainda não se deu conta de escutar. E realmente, quando tu vê que pessoa X não escuta... tu evita gastar energia TENTANDO ser ouvida por essa pessoa.

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  5. "Então, olhe nos olhos daquela pessoa que também está te concedendo seu tempo. Esteja presente. Escute. Escute ativamente". Exatamente isso. Senti muita falta disso quando voltei para o Brasil, pouquíssimas pessoas queriam me escutar, perguntar da minha vida. Acho que é por isso que eu tenho blog. Eu sou a pessoa que escuta e direto ouço a voz do Morrissey cantando na minha cabeça "oh, why do I give valuable time to people who don't care if I live or die".

    www.umnovodestino.com.br

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    1. Oi Ale! É como se estivéssemos vivendo em realidades diferentes. Quando eu me dei conta de que algumas pessoas não estão dispostas a ouvir, eu comecei a poupar minha energia.

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